segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Rizoma


Era apenas um pequeno e murcho ramo de cor lilás solto na calçada. Sob o sol não duraria mais que dois dias. Olhei para o meu filho e me abaixei para apanhar o pedaço de planta agonizante. Fiz sem pensar e ele notou isto. Mas plantar onde papai? Silêncio.
Chegando a casa, providenciei alguma vasilha para provisoriamente colocar na água o pedaço de planta, com a suspeita que ele não agüentaria. Para minha surpresa, no outro dia, logo ao amanhecer, algumas flores de um delicado rosa brotaram por entre as folhas. Talvez um sinal da planta, na sua luta pela sobrevivência. Ou um gesto de agradecimento?
A partir daí, as mudanças vão se operando rapidamente. Algumas folhas já desgastadas pela luta vão cedendo lugar, Novos brotos vão surgindo. E um dos galhos já esboça duas folhas verdinhas, lá bem no alto, destemido tal um cume de uma montanha. Só agora me lanço com atenção ao transparente vaso. Inversamente, mergulhados na vasilha, muitas raízes e pequenos rizomas desenham uma cabeleira, procurando terra, buscando um chão, sobrevivência.
O silencioso trabalho da natureza já me faz pensar em comprar jarro e terra para acomodar a mais nova habitante da casa. Já não é mais um pedaço de planta, talvez ganhe algum espaço logo no meio da mesa.
Este inesperado diálogo com o mundo vegetal me faz lembrar um pequeno texto de dois grandes pensadores de nosso tempo, Gilles Deleuze e Félix Guattari, autores do livro “Mil platôs- capitalismo e esquizofrenia”. Trata-se de “Rizoma”, que na edição brasileira está no primeiro volume. Nele, os dois filósofos tomam emprestado da biologia a noção de rizoma e mostram como o conhecimento é construído em forma de ramos, árvores. “A árvore já é a imagem do mundo, ou a raiz é a imagem da árvore-mundo” (p.13) Assim, a lógica da árvore está presente na Psicologia, na informática e na Lingüística etc. Os dois pensadores querem sair dessa lógica binária e partir para a multiplicidade, como rizomas que se multiplicam em pequenas radículas que compõem o balé vegetal imprevisto da vida na Terra.
Num mundo em que tudo está conectado é possível se pensar hoje na multiplicidade de uma humanidade ligada/desligada em mil platôs, redes complexas abarcam comportamentos, pensamentos e mobilizações. Um mundo rizomático no qual tudo está interligado, como no filme “Babel” (da trilogia “Amores Brutos” e “21 gramas”, do diretor Alejandro González Iñárritu) mesmo que muita gente não tenha consciência disto.

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