sexta-feira, 17 de abril de 2009

Experimentando Bradbury


Não sei o que pode ter sido. Uma coincidência, um insight, um lapso ou qualquer outra coisa que aconteça sem a consciência rígida e observadora tente apreender com a razão. Assim foi o meu encontro com a obra do escritor norte-americano Ray Douglas Bradbury (1920-), considerado um dos grandes mestres da ficção científica mundial.
A coletânea de contos “Os frutos dourados do sol” (de 1953), publicada no Brasil pela Francisco Alves na coleção Mundos da Ficção Científica, impressiona por sua atualidade e principalmente pela voltagem de sua prosa poética.
O interessante é que na ficção científica de Bradbury existem naves espaciais, marcianos de verdade e estranhos seres dotados de poderes superiores sem que eles sejam o centro da narrativa, uma vez que sua matéria prima é o homem ocidental, suas contradições e desejos.
“Os frutos dourados do sol” juntamente com “O homem ilustrado” (1951) e as famosas “Crônicas marcianas” (1951) formam uma espécie de trilogia na qual Bradbury descortina todo seu humanismo em narrativas que impressionam por construir elementos para uma filosofia do homem em plena idade da máquina. O escritor Bradbury teve grande parte de sua produção lançada na década de ouro dos anos 50, mas não ficou preso a ela.
O mais o certo é que com a filmagem de uma adaptação do seu principal romance “Fahrenheit 451” em 1966 pelo cineasta François Truffaut, o livro adquiriu ares de cult às vésperas de uma grande revolta da juventude, como ocorreu em todo mundo em maio de 1968. O título “Fahrenheit 451” remete justamente à temperatura sob a qual os livros se incineram, história contada com maestria de um grande narrador da ficção cientifica mundial para mostrar que os livros foram proibidos por uma futura e alienante civilização que vive sob as ordens de telas de tv, na qual o indivíduo é reduzido ao nada. Tudo a ver com a realidade que sequer suspeitamos viver hoje. Assim, com suas estranhas profecias, o livro de Bradbury vai ser comparado a um dos grandes mestres da literatura humanista, Audous Huxley, autor de “Admirável mundo novo” (1932).
Talvez a glória literária alcançada com o filme e o livro “Fahrenheit 451” levou ao interiorano escritor norte-americano a estender sua carreira por décadas, sempre sendo descoberto por novos leitores, experimentado de forma diferente por diversas gerações. É que as lembranças, o pesadelo nuclear e os regimes totalitários irão sintomaticamente acompanhar o homem moderno em toda a sua vida. E as experiências vividas em Hiroshima e Nagasaki ou mesmo em campos de concentração nazi-russo-americanos como o de Auschwitz, Sibéria, Iugoslávia, Guantánamo. Assim, vale conseguir seu exemplar da coletânea dos melhores contos de Bradbury em “A cidade inteira dorme e outros contos“ (2008), recentemente publicado pela Editora Globo. E experimentar Bradbury um escritor em estado puro, contemporâneo...

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